
É comum ouvirmos sobre burnout, ansiedade, estresse, todos, em geral, sintomas de uma vida corrida, focada na excelência e doutrinada por metas inatingíveis e empresas predatórias. O trabalho invade o tempo de lazer. O perfeccionismo impera.
Dominados pela cultura da agitação (hustle culture, em inglês) – filosofia que valoriza a produtividade acima de tudo, sem considerar o descanso e o equilíbrio entre vida pessoal e profissional –, deixamos de lado hobbies, sono, relaxamento e, principalmente, o ócio. A tendência passou a ser admirar os que se destacam pela excelência e dedicação absoluta ao trabalho e desvalorizar aqueles que querem também relaxar, espairecer e brincar.
Em estudo realizado em 2024, o Instituto Locomotiva mostrou que 65% da população brasileira não tem um momento sequer de ócio ou sem fazer nada em sua rotina semanal, comprovando a dificuldade das pessoas de conciliarem trabalho, lazer e atividades do dia a dia. A maioria dos participantes, 79%, afirmou que a atividade mais praticada por eles é o uso das redes sociais.
E mesmo aqueles que querem sair desse redemoinho, sentem-se sem ferramentas para conseguir. Existe saída? Um equilíbrio?
Uma ferramenta para o desenvolvimento pessoal
Na década de 1990, o sociólogo italiano Domenico De Masi desenvolveu a teoria do ócio criativo, que valoriza o tempo livre como uma oportunidade para a criatividade e o desenvolvimento pessoal. Em seu livro de mesmo nome (Sextante, 1995), ele desafiou a noção tradicional de que o trabalho produtivo deva estar separado do lazer.
De Masi e sua teoria transformaram o ambiente empresarial no mundo todo, com muitas companhias adotando trinta horas semanais ao invés das tradicionais quarenta. O conceito abriu portas, inclusive, para o debate sobre a mudança na escala de trabalho no Brasil.
Contudo, apesar de comprovadamente eficaz o equilíbrio em nosso dia a dia, seguimos na toada de infinitas horas dedicadas às obrigações, tentando atender às expectativas de todos ao nosso redor. Enquanto isso, o tempo passa, filhos crescem… e a maioria parece não perceber como pensamos cada vez menos em NÓS mesmos.
Chegou o momento de sermos um pouco mais egoístas, deixando de lado temas hoje em voga, como empatia acima de tudo e coletividade. Não defendo um individualismo a qualquer custo, mas sim, que todos necessitam de um tempo para si, tanto pelo bem-estar físico quanto mental. Precisamos largar a pressão das redes sociais e dos amigos e familiares para estarmos mais plenos e em paz.
A solução pode estar em atividades ou hobbies que tenham a ver com você e que lhe proporcionem momentos de reflexão, diversão ou abstração de tudo e todos.

A importância da conexão mente-corpo
O estresse é um dos grandes causadores de doenças físicas e emocionais. Por isso, estar bem consigo mesmo é essencial para que tenhamos sucesso e consigamos ser felizes.
E quando temos problemas, ao invés de pararmos e refletirmos sobre possíveis causas, culpamos o cônjuge, o chefe no trabalho, o amigo que não nos ajudou etc., sempre sem chegar ao ponto crucial: somos doentes num mundo caótico e precisamos nos cuidar.
Em Heal: O Poder da Cura, o diretor Kelly Noonan enfatiza a importância de todos assumirem um papel ativo na jornada de cura, objetivando o bem-estar emocional, mental e espiritual. O documentário aborda temas como o impacto do estresse, o papel do subconsciente na saúde física e o poder de cura da atenção plena e da meditação.
O filme compartilha histórias de pessoas que passaram por curas notáveis, algumas até de enfermidades graves, como câncer e doenças crônicas, através da mudança de sua mentalidade e adotando práticas de cura alternativas.
A jornada de cura é um passo importante nessa possível nova etapa de vida de cada um, uma etapa de mais tranquilidade e autoconhecimento. Uma etapa em que o seu bem-estar venha em primeiro lugar, não uma demanda da empresa onde atua ou uma questão familiar.

Como uma onda no mar
Uma das atividades tidas como mais relaxantes e perfeitas para reflexão – principalmente se você não é um corajoso em busca de ondas gigantes em Nazaré, Portugal – é o surfe, prática que vem ganhando adeptos em todo o mundo segundo a Associação Internacional de Surfe (ISA, na sigla em inglês), com destaque para o Brasil.
Hoje, diversas pessoas só conseguem trabalhar após pegar uma onda e pensar na vida enquanto espera a próxima. Para elas, é um momento de meditação.
A importância de uma atividade para você curtir o seu eu é comprovada em Alegria de Verão: A Busca Pela Onda Perfeita, de Greg Reitman e Bruce Brown. O doc mostra a aventura de Robert August e Mike Hynson ao redor do planeta em busca da onda perfeita, jornada que será inspiradora para muitos indivíduos ao conhecer e entender a cultura do esporte, ou como eles dizem, de uma filosofia de vida.

A falsa felicidade
Um dos maiores símbolos dessa realidade corrida e sem tempo para qualquer coisa são as redes sociais. Segundo a agência We Are Social, o número de adeptos aumenta anualmente, ao mesmo tempo que diminui a idade em que os jovens têm acesso às telas pela primeira vez. Esse fenômeno foi explicado por Jonathan Haidt em seu livro best-seller A geração ansiosa: Como a infância hiperconectada está causando uma epidemia de transtornos mentais (Companhia das Letras, 2024).
O autor mostra como as mudanças nas condições de infância, muitas vezes impulsionadas pela tecnologia, pela superproteção e pelas novas dinâmicas sociais, estão gerando uma epidemia de transtornos mentais entre os jovens, particularmente ansiedade e depressão.
Portanto, torna-se compreensível que cheguemos à idade adulta ansiosos, preocupados com julgamento alheio e sem tempo para refletir e descansar.
Esse burnout digital também é analisado com maestria no documentário Happy: A Ditadura da Felicidade nas Mídias Sociais, de Elisa Jadot, que explica como necessitamos da aprovação da sociedade e que não podemos nos dar ao luxo do ócio, visto que não conseguimos deixar a tela de lado. Já deitados na cama para dormir, bisbilhotamos as últimas postagens publicadas; e, assim que abrimos os olhos, conferimos as atualizações mais recentes.
Dessa forma, como ir ao cinema, fazer uma aula de dança ou yoga, surfar ou somente se deitar na cama e olhar para o teto? Impossível. Ler um livro sem checar o WhatsApp a cada duas páginas… de jeito nenhum!

Uma luz no fim do túnel?
Mudar nosso estilo de vida é um desafio imenso. Aqueles que conseguiram transformar seu cotidiano afirmam que a luta foi intensa e que ela jamais acabará. A todo momento somos puxados para trás, seja pela ânsia de ver as últimas atualizações nas redes sociais, pelas demandas do trabalho ou pelas tarefas comuns da semana.
Contudo, você já pensou em viver de acordo com seus próprios valores e sem se preocupar com a aprovação ou o julgamento dos outros?
É isso que prega Fumitake Koga e Ichiro Kishimi em seu livro A coragem de não agradar (Sextante, 2018). Ambos sugerem que, ao abandonar a necessidade de agradar os outros e a busca pela excelência, as pessoas conseguem desenvolver uma mente mais crítica e desapegada, sendo mais autênticas, vivendo de acordo com os próprios valores e dedicando mais tempo para si mesmas.
Ter coragem é ser capaz de viver de acordo com quem você realmente é, sem se preocupar com expectativas alheias ou com a pressão social. Esse sentimento vem de uma autoaceitação profunda e da disposição de enfrentar os desafios da vida com autenticidade.
A autoaceitação, essencial para todos, jamais será algo que acontece de forma passiva, mas sim, uma escolha ativa. Podemos decidir viver uma vida significativa e satisfatória, menos estressante e mais plena, mesmo quando as circunstâncias externas não são ideais.
E quando se sentir aprisionado pelas decisões do passado e por erros cometidos, lembre-se que podemos – e devemos – transformar a vida a partir do agora. O que realmente importa é o que fazemos no presente para criar um futuro diferente.
Aproveite a vida, tome decisões a favor de seu bem-estar físico e mental, tire um tempo para você e pratique atividades que simplesmente lhe deem prazer, sem se preocupar com a opinião de terceiros e com a excelência.
Seja feliz. Seja livre. Sempre.
Neste texto e para ir além:

Filme: Heal: O Poder da Cura, na aquarius

Filme: Alegria de Verão: A Busca Pela Onda Perfeita, na aquarius

Livro: O ócio criativo, de Domenico De Masi