
Nossas escolhas alimentares não são tão nossas quanto parecem. Nem todos temos acesso aos mesmos tipos de alimentos, principalmente no tocante à qualidade. No cenário atual, onde experimentam-se extremos — do aumento de casos de fome ao aumento no número de pessoas com obesidade —, fica cada vez mais evidente que múltiplos desequilíbrios prevalecem ao redor de nós.
Numa realidade em que, quase globalmente, tudo funciona 24 horas por dia, é possível comprar qualquer tipo de comida ou produto alimentar a qualquer hora, seja por aplicativo ou sites de marketplace… basta querer e poder. Porém, como podemos escolher e ter discernimento?
Estudos apontam que o cérebro humano não se desenvolveu e não está evolutivamente adaptado a ficar exposto a uma alta disponibilidade de alimentos. É difícil controlar o que e o quanto comemos quando existe uma indústria de marketing, propagandas e adição de produtos “viciantes” que são muito convincentes e estimulam cada vez mais o consumo alimentar, principalmente de fast food e alimentos ultraprocessados.

Por outro lado, grande parte do planeta vivencia casos de fome, insegurança alimentar e desnutrição. As disparidades e desigualdades na distribuição de renda não afetam somente comunidades remotas, como também podem ser observadas nos locais mais urbanizados, próximos de nós. Então, por um lado, temos uma indústria de alta produção de alimentos sem qualidade, um elevado consumo alimentar que leva ao número de casos de sobrepeso e obesidade; e, em paralelo, os quadros de desnutrição, insegurança alimentar e baixo acesso a nutrientes.
Digo que nossas escolhas não são apenas nossas, pois todos sofremos grande influência das propagandas e comerciais aos quais somos expostos e que nos convencem a comprar e consumir excessivamente. Um outro ponto importante é a produção de alimentos em larga escala, que acontece paralelamente com os elevados casos de desperdício, e utilizando métodos que causam danos irreversíveis ao meio ambiente. Entende-se que, desde a Revolução Industrial e a Segunda Guerra Mundial, por muitos anos o foco esteve em conseguir produzir mais e mais, gerar produtos com prazo de validade estendido e que, se não fossem nutritivos, pelo menos gerassem uma intensa sensação de prazer.

Décadas após, observa-se ainda essa cultura de produção em massa, muitas vezes (quase sempre) sem necessidade, que impacta negativamente o meio ambiente e traz grandes consequências para o futuro do planeta. Um exemplo prático encontra-se em como são produzidos os alimentos de origem animal (carnes, ovos, leites e queijos). Atualmente, as grandes indústrias utilizam métodos cruéis de produção, tanto para os animais quanto para o solo e o ar. Entendemos, então, que o problema não está em consumirmos a carne, mas sim em sermos coniventes e passivos com a forma como a produção está acontecendo.
A maneira como os sistemas alimentares afetam a nossa saúde, as escolhas diárias e a saúde do planeta é muito bem retratada no documentário americano Food, Inc.: O Retorno, disponível na aquarius, que foi dirigido por Robert Kenner e Melissa Robledo e narrado por Michael Pollan e Eric Schlosser. São levantados diversos questionamentos e expostas muitas informações atuais sobre alimentação e nutrição, relatos de casos relevantes nesse contexto, e é estimulada uma reflexão necessária.

Food, Inc.: O Retorno, sequência do documentário Food, Inc., indicado ao Oscar e vencedor do Emmy em 2008, mostra a maneira insustentável e alarmante com que algumas marcas e empresas trabalham para produzir alimentos. Quem sofre não são apenas os consumidores, mas também os próprios trabalhadores dessas companhias, que são submetidos a baixos salários e indignas condições de serviço.
Também é documentado a respeito dos agricultores inovadores, produtores de alimentos com visão de futuro e ativistas dos direitos trabalhistas, que enfrentam essas empresas para inspirar mudanças e construir um futuro alimentar e nutricional mais saudável e sustentável.
Vale a pena assistir, reassistir e refletir sobre tudo que é exposto nesse incrível e importantíssimo documentário. Entender melhor como adotar escolhas alimentares mais saudáveis, como apoiar causas e movimentos sociais são ações com potencial transformador, não só a nível individual, mas com impacto na coletividade também.

É preciso lembrar que comer também é um ato político, e são as pequenas e grandes ações diárias que ditam o nosso futuro. Existe muito a ser feito ao alcance das nossas mãos. E talvez o primeiro passo seja nos mantermos informados.
Neste texto e para ir além:

Documentário: Food, Inc.: O Retorno, na aquarius

Documentário: A nova ciência da comida, na aquarius

Documentário: Em defesa da comida, na aquarius
