
Você tem deixado a ansiedade dominar seu dia a dia? Essa me parece uma forte tendência, aquela moda que pega sem a gente se dar conta e da qual fica difícil se desvencilhar depois que vira costume. Logo se torna quase um problema de estimação: “Ah, é a minha ansiedade”, justifica-se. Mas já parou para pensar quais as consequências disso na vida prática? Será que estamos sendo tão funcionais como poderíamos?
Um programa de televisão tem atraído minha atenção nos últimos tempos. Acumuladores Compulsivos, que retrata a saga de famílias contra o transtorno de acumulação de algum de seus integrantes, com o apoio de profissionais de saúde mental. O que aparenta ser só um hábito bobo de guardar coisa velha traz resquícios de traumas, medos, rejeições, diversos sentimentos também acumulados — muitas vezes, desde a infância.

E o que isso tem a ver com a ansiedade? Venho notando que a minha produtividade é inversamente proporcional à quantidade de tralha ao meu redor, e isso me deixa ansioso. Essa mania de juntar coisinhas, guardar papeizinhos, empilhar ideias e nunca as colocar em prática vai causando um desgaste interno silencioso, mas seu resultado pode ser gritante.
O livro Essencialismo: A disciplinada busca por menos, de Greg McKeown, virou meu amigo de infância há pouco tempo. É daqueles com que posso contar a qualquer momento, quando bate o desespero de estar me afogando em um mar de coisas. E não necessariamente de coisas físicas, mas de tarefas, de compromissos evitáveis, de inúmeros sins desnecessários em detrimento de nãos, que acabam gerando mais angústias do que resultados.
“O caminho do essencialista é buscar de forma incansável o menos porém melhor.”
Isso é o que diz o autor já no primeiro capítulo da obra. Mas será que é simples ir atrás só do essencial quando se está submerso até a testa nessa cruel sociedade de consumo?

Um dos motivos que me leva a querer me livrar das coisas é evitar tomadas de decisão. Faça o teste por uma semana: separe de uma vez, num domingo, as roupas que irá usar ao longo dos próximos cinco dias úteis. Mas nada de mudar de ideia depois, hein! Não ter de selecionar o figurino a cada manhã já vai te poupar tempo e deixar o seu momento pré-jornada mais leve, com menos uma coisa para decidir. Sempre a tal da coisa. E é natural que o coração e os pensamentos acelerem quando nos dão opções, seja do que for. Por isso, o ideal mesmo é manter no guarda-roupa o mínimo possível. Se temos escolhas a fazer, temos desgaste, ainda que nem todo mundo se incomode com isso. Eu me incomodo.
Tive a oportunidade de assistir na aquarius a um documentário cuja temática principal não é a acumulação, mas traz uma visão cirúrgica sobre o assunto. Em Jornadas para os Limites da Consciência, três sujeitos com distintas trajetórias de vida têm suas histórias de viagens psicodélicas relatadas em animações incríveis, que nos fazem viajar junto. Eles expõem suas conquistas e aflições após experienciarem essa desconexão da realidade e conexão com o Eu mais profundo.

Na produção, o psicólogo Rick Doblin comenta que os psicodélicos, se administrados corretamente, podem ser fortes aliados no combate ao consumismo. Isso porque, sob o efeito dessas substâncias, seria possível entender a real importância de tudo — é como se a nossa balança de valores estivesse mais apurada. A compreensão da função que desempenhamos no Universo fica escancarada, e muito do que julgávamos essencial passa a ser banal. Afinal, se do mundo não se leva nada e só temos dois pés, faz sentido ostentar 30 pares de sapatos? Os alucinógenos teriam, segundo o especialista, essa capacidade de proporcionar o foco no que é primordial e ressignificar a nossa relação com as coisas.
O escritor britânico Graham Hancock também levanta boas questões no filme, e um dos tópicos abordados é justamente sobre nos definirmos a partir do que temos e não do que somos. Ele explica que Timothy Leary, um dos grandes entusiastas e divulgadores do LSD na década de 1960, entendeu em seus momentos de êxtase lisérgico que a humanidade poderia estar sendo conduzida por um caminho falso, ludibriada pela ilusão do ter. Ainda não pude vivenciar uma experiência nesses moldes, mas me atrai a ideia de que um mergulho interior consiga nos explicar tanto. Tanta coisa.

Vivemos em um balaio de “por quês”. Carregamos muito mais perguntas do que respostas, e é interessante pensar em como encarar o nosso próprio Eu pode nos render muitas das soluções de que necessitamos. Por exemplo, essa coisa de querer mais e mais, aquele presentinho para si mesmo como recompensa, a insaciável vontade não sei de quê… Só mesmo o Eu mais profundo pode responder com sobriedade às questões de que nossa mente superficial — embriagada pela síndrome do “eu mereço” — tenta se esquivar a todo custo.
Meu objetivo de vida, no momento, é ter menos objetivos de vida, em se tratando de aquisições materiais. Uma rotina minimalista parece ser o primeiro passo ideal para dar um basta nesse excesso de informações que nos leva à loucura e que, ainda assim, insistimos em aceitar passivamente. Talvez só mesmo ultrapassando as fronteiras da mente seja possível compreender por que agimos como robôs que seguem tendências, repetem padrões, imitam semelhantes, obedecem a ordens e, claro, querem coisas e mais coisas e mais coisas. Que coisa, não?
Neste texto e para ir além:

Filme: Jornadas para os Limites da Consciência, na aquarius

Série: Acumuladores Compulsivos, no A&E

Livro: Essencialismo: A disciplinada busca por menos, de Greg McKeown